sábado, 3 de maio de 2014

Existe vida além do computador

computador

 Entramos o século 21 abarrotados de equipamentos eletrônicos à disposição das pessoas de todo o mundo. Criatividade, obrigatoriamente, tem que estar associada a algum tipo de equipamento ligado à Internet, celulares, computadores. Até mesmo a criação de outros produtos está ligada ao computador: desenhos, filmes, esculturas, música. Quem não está nessa “onda” está por fora, desplugado, desconectado.

Sempre que falo com alguém que não tem computador, brinco: “você é uma pessoa de sorte”. Atualmente, a pressão é tão grande para que as pessoas vivam em torno do computador, que aquele que não tem um está quase que automaticamente excluído da sociedade. Então, quem pode e, até quem não pode, faz o esforço de comprar um, ou mesmo fazer um curso, se inteirar do assunto. Não ter um computador tornou- se quase um caso de psicólogo.

Mas será que existia vida antes do computador e haverá depois dele? Evidentemente que nossos pais viveram sem computador. E bem. O mundo existia, funcionava, progredia, antes do computador.

Quem imagina que não, comparo a meus filhos que só me conheceram usando bigode, então imaginam que já nasci de bigode. A televisão, o rádio, o telefone, a máquina fotográfica, a geladeira e muitas outras tecnologias existiam antes do computador. Não pensem os mais jovens que o mundo era chato antes do computador. Penso que ele ficou mais chato e monótono justamente com o advento do computador.

Antigamente, era possível se diferenciar a redação de um jornal de um escritório de engenharia, de advocacia. Hoje, não. Em qualquer lugar está lá o onipresente computador e, claro, um funcionário que transfere toda a responsabilidade, e também a culpa, a ele. “Eu conheço o senhor, mas o computador não. Desculpe.”

Quando comprei meu primeiro computador eu já tinha mais de 30 anos. Perdia mais tempo tentando entendê-lo que realmente utilizando-o. Perdia mais tempo tentando atribuir-lhe alguma utilidade que realmente utilizando- -o. Isso, por que já possuía uma intimidade de mais de 20 anos com a máquina de escrever, tesouras, cola e papel. Foi assim que escrevi meu primeiro livro, e deu tudo certo. Com o passar do tempo e o avanço do computador, transferi inúmeras atividades para o computador: livros, impressão, elaboração de textos, correio, bilhetes, fotografias, filmes e outras tantas coisas que fazia separadamente.

Não sou resistente às novas tecnologias e não nego que avançamos em muitas coisas depois do computador. Estou escrevendo este texto em meu laptop. Resisti o quanto pude a comprar um, mas não teve jeito. Minha profissão exige e agora tenho que levar o escritório até para o avião. Mas confesso que muita coisa perdeu a graça.

Escrever cartas à mão era mais gostoso e nostálgico. Ir aos correios caminhando e encontrando amigos, olhando as lojas, era algo impagável. Lembro- -me, com saudade, dos meus amigos carteiros e do imponente prédio dos correios. Escrever livros e artigos eram coisas que só escritor sabia. Agora todo mundo tem seu computador, pensa que é escritor, e sai copiando e colando, ajudado pelo corretor, pela Internet e suas inúmeras ferramentas.

A música, o desenho, os filmes e tantas outras artes foram afetados pelo computador, de forma tal, que elas perderam um certo brilho que chamávamos de genialidade. Vibrávamos com os efeitos especiais dos filmes. Agora dizemos: “Ah, foi feito no computador.” Muita coisa melhorou, mas, confesso que tenho que garimpar muito para encontrar um texto genial, um filme ou desenho que não seja “fabricado” pelo computador. Não acredito mais em fotos, e minha derradeira decepção será quando todos os artistas da TV forem substituídos por imagens computadorizadas. Será o fim.

A vida tornou-se concentrada em uma única coisa: o computador. Ver TV, filme, escrever livros, cartas, desenhar, falar com os amigos, negociar, fazer conferência, estudar, fazer anotações, trabalhar, ir ao banco, e sei lá quantas outras coisas, tudo no computador, olhando para a telinha e digitando teclas, pode parecer a maravilha do século 21, mas também é a monotonia mais monótona da História.

Confesso que a falta de flores, de ar puro, de barulho, de lápis e borracha, de pessoas do lado, de conversas, de caminhadas, enfim, de realidade, tolhem a minha criatividade. Inventar alguma coisa olhando o dia todo para uma telinha é tremendamente mais trabalhoso que qualquer outra dificuldade que tínhamos no passado.

Por isso, de vez em quando, quero deixar a telinha de lado e escrever uma carta à mão, fazer um desenho a lápis, caminhar até aos correios, ir à feira, assistir a um filme no cinema, conversar com o porteiro do meu condomínio, visitar um amigo distante, tomar um cafezinho com o gerente do banco, escrever um texto à mão, e rabiscar, rasurar até quanto for necessário. Tenho certeza que existe vida além do computador.

Fotos: Internet
:: Atilano Muradas
Fonte: www.lagoinha.com

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